quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Anjos da mjnha Igreja


Anjos da Minha Igreja

Na Igreja da minha Terra
Há anjinhos no altar
São tantos os anjinhos
Ai! Quem mos dera contar…

Dois e dois e mais dois
Seis são.
E mais seis uma dúzia
Pois então.
E três quinze e três dezoito,
Dezanove, vinte, vinte e um.
E um e outro e mais algum…

Quando eu era pequenina
Gostava de imaginar:
De noite, pela calada,
Desciam os anjos em revoada
Dos seus lugares no altar!
Havia um mais atrevido,
No Sacrário ia pousar,
O Menino Jesus espreitava
E que contente ficava,
Com os anjos ia brincar!

Um dia, devagarinho,
E sem ninguém o saber,
Levei uma bola p´ra Igreja,
Deixei-a num cantinho
P´ros anjos a poderem ver…


Na noite desse dia,
Na minha cama, enquanto dormia,
Sonhei. Vi os anjos a jogar:
Duas equipas em campo,
O Menino Jesus a rematar!
Um anjo, na baliza, defendia,
Outro com a bola fugia,
Lá vinha um p´ra lha tirar,
Corria outro a driblar…
Eu, entusiasmada, aplaudia!
O Menino um golo metia!
Goooo…lo! Goooo…lo! Que alegria!

Pela manhã, a correr,
Fui à Igreja p´ra ver:
Os anjos lá estavam,
Cada um no seu lugar,
A bola no mesmo canto
Sem dali nunca arredar.

Mas eu sabia,
(O segredo era só meu),
Que os anjos à porfia
Com o Menino Deus
Na Igreja, em Nelas, brincavam
Como se estivessem nos céus!


Nelas, 15 de Agosto de 2010
Festa da Assunção de Nossa Senhora

Avoinha Sãozinha

quarta-feira, 7 de abril de 2010

História do Rato Rateco e da Ratinha Filó

HISTÓRIA DO RATO RATECO E DA RATINHA FILÓ


O Rateco e a Filó vivem em casa da Avóinha, na Serra da Amoreira, debaixo do armário da cozinha. São muito meus amigos.
Quando lá estou sozinha, sem ninguém ver, Dom Rateco e Menina Filó saiem do seu buraquinho e vêm até cá fora. Como são ratos especiais conversam muito e eu trato-os bem. Dou-lhes papinhas: queijo, pão, doces; e também coisas pequeninas para arranjarem a sua casa: trapinhos para cobertores, caixas de fósforos vazias para fazerem a mobília e até um dedal para fazer de lavatório.
A casa deles é muito bonita: tem janelas e cortinas e até jarrinhas com flores.
Nas nossas conversas falamos dos netos da Avóinha. Uns maiores outros mais pequenos, algumas meninas e também rapazes.
E falamos de outros meninos que a Avóinha conhece ou não conhece, que lêm esta história ou a ouvem contar… Os ratinhos queriam muito conhecer todos os meus amigos, mas são tão envergonhados. Quando aparecem meninos que os querem ver, escondem-se sempre debaixo do armário. E os meninos ficam tristes e a Avóinha fica triste e os ratos... cheios de medo!
Por isso, agora, vou tentar ajudá-los a perder a vergonha e o medo. Arranjei umas botas e uma jaqueta para o Rateco e uma saia rodada e um chapelinho para a Menina Filó. Que bonitos eles ficaram! Comprei-lhes uns bilhetes pequeninos para o autocarro e mandei-os passear. Ah, esquecia-me de dizer: Também comprei uma carteira para pôr a tiracolo, para a Filó e um guarda-chuva para o Dom Rateco.
Gostaram muito do passeio que contarei numa próxima história… e prometo-vos, se se portarem bem, mais histórias destes ratinhos tão engraçados, que afinal vivem na imaginação . da Avóinha
Sabem, meninos, estes ratinhos são o segredo da Avóinha e são tão velhinhos que também já eram o segredo da Bisavó e se continuarem a ter vergonha e a não se quererem mostrar, um dia passarão a ser o segredo das vossas Mães, quando os meninos forem grandes e tiverem filhos e as vossas Mães passarem a ser avóinhas.

Serra da Amoreira, 27 de Janeiro de 1996

Maria da Assunção Ferraz de Oliveira

O Passeio do Rato Rateco e da Ratinha Filó

O PASSEIO DO RATO RATECO E DA RATINHA FILÓ

Lembram-se do Rateco e da Filó, aqueles ratinhos simpáticos, amigos da Avóinha, que viviam lá em casa e eram muito envergonhados? Pois foram passear. Não queriam. O medo e a vergonha que fazem com que sempre se escondam, eram mais fortes do que eles, mas tanto teimei que consegui convencê-los.
Saíram os dois de mão dada ou pata dada, mais propriamente, levando na maleta o GPS pequenino que lhes ofereci e uma bela merenda para comerem quando a fome chegasse.
Encontraram uma sombra logo à saída de casa, sentaram-se numa pedrita, pegaram no GPS e toca a planear a viagem: Conversa daqui, conversa de acolá, escolheram o local mais próximo, o Parque do Monteiro-Mor e o Museu do Traje.
Correram pela serra abaixo até à paragem da camioneta. Esta parte da viagem foi fácil, sempre a descer, ninguém os viu e a vergonha… não foi precisa… ficou no saco.
O primeiro problema foi a subida para o autocarro, o degrau era tão alto!
Valeu-lhes uma velhota que subiu devagar: agarraram-se à saia dela e lá foram aos trambolhões até aterrarem debaixo de um banco.
Agora é que são elas! É preciso mostrar os bilhetes ao Sr. Condutor. Vai tu, vou eu… quase se zangaram, mas resolveram ir os dois. O homem, quando os viu em cima da máquina, abriu a boca até às orelhas, arregalou os olhos e ficou sem fala! Os bilhetes eram válidos, só lhes fez sinal que podiam seguir, e a vergonha continuou dentro do saco.
Saíram no Lumiar, deram um pulinho para a rua e depressa chegaram à porta do Museu.
O pessoal foi simpático, deixaram-nos entrar mesmo sem bilhete, (não tinham bilhetes para ratos), mas fizeram-lhes uma recomendação que diziam ser muito importante: É EXPRESSAMENTE PROÍBIDO ROER SEJA O QUE FÔR: TRAJES; TAPESSARIAS, QUALQUER TEXTIL. SE ISSO ACONTECER O RATICIDA ENTRA EM ACÇÃO. Os nossos ratinhos como eram civilizados, claro que não roíam nada. E o raticida? O que era isso? Não sabiam, não se assustaram.
Que bela visita! Havia trajes lindos, do século XVI até aos dias de hoje, trajes de reis de Portugal e da sua Corte, modelos de costureiros famosos e uma grande colecção de trajes regionais.
Os ratinhos estavam encantados, já nem se lembravam da vergonha.
A Filó dizia ao Rateco: Quem me dera poder usar um vestido destes! Olha aquele, de seda verde clara, com mangas tufadas, saia de balão, grande decote e bordado no peito. Que linda eu ficava e como tu havias de ficar orgulhoso da tua ratinha!
Respondia o Rateco: Pois é, mas eu gosto de ti mesmo assim e para mim era complicado ter de usar uma cabeleira como a daqueles senhores…
E a secção dos acessórios: Chapéus, sapatos, malas, botões, óculos, leques, era um nunca acabar de coisas lindas que os encantavam. Podiam ficar ali toda a vida que havia sempre mais e mais coisas para ver!
A merenda no Parque do Monteiro-Mor soube-lhes bem.
Que árvores tão grandes! Aquela araucária que já vem do século XVII fê-los parecer ainda mais pequeninos. E o Lago dos Leões e o dos Cisnes, os peixinhos, os patos e os pássaros em grandes espaços onde não se sentem presos como nas gaiolas! As ruas, as pontes, as grutas, as escadas e os caminhos! Correram, saltaram, brincaram, jogaram às escondidas. Os ratinhos estavam felizes!
Já era quase noite quando foram embora. Tinham-se esquecido das horas, o tempo passou tão depressa!
À saída tiveram uma surpresa: A Avóinha à espera deles.
Foi só dar uma corrida, entrar no carro e, muito bem sentados no banco de trás, com os cintos apertados, não mais se calaram até casa. Contaram tudo, com todos os pormenores!
Gostei de os ouvir. Ao chegar a casa perguntei-lhes se já tinham perdido o medo e a vergonha. Eles, muito cansados, disseram-me, baixinho, ao ouvido: “Medo já não temos, mas a vergonha não a podemos perder, senão tínhamos de deixar de ser o segredo da Avóinha”.

A Ninhada da Ratinha Filó e do Rato Rateco

A NINHADA
DA RATINHA FILÓ E DO RATO RATECO

Que bela surpresa hoje pela manhã! A Filó apareceu à hora do pequeno-almoço e vinha com uma barriga tão grande e tão redondinha! “Está à espera de ratinhos! Está à espera de ratinhos!” exclamou a Avóinha toda entusiasmada. “É verdade” disse a Filó com a sua vozinha aflautada e apareceu logo o Rateco todo importante porque ia ser pai.
Resolvi ajudá-los a preparar o enxoval. Não havia tempo a perder pois as ratas só tem 3 semanas de gravidez!
Quantos ratinhos iriam nascer? Só na hora se saberia. (Porque não há médicos de ratos, nem ecografias, essas coisas só são usadas em ratos de laboratório o que não era o caso dos nossos amigos). Assim fizemos uma dúzia de camisinhas, alguns casacos de malha, toucas para a cabeça e alguns babetes. Ainda pensámos fazer botas, mas era uma trabalheira: cada rato com quatro pés!
Arranjámos um ninho com algodão em rama para a Filó ter os filhos.
Depois fizemos o berço: Que coisa linda: A base era uma cestinha, redonda, pequena, que a Avóinha encontrou no sótão e que antigamente servia para fazer requeijões. Foi toda forrada: por fora com folhos de um tecido às florinhas azuis e cor de rosa (dava para ratos e ratas), por dentro seda branca bem acolchoada com pelo da Filó e do Rateco que eles arrancaram com todo o carinho para os seus “meninos”. De uns bocados de tecido de lã escocesa fizemos os cobertores, e por cima, ainda houve tempo para fazer uma manta de crochet, às rosetas, toda branquinha. Ficou lindo, o berço, e os pais ratos encantados.
Depressa se passaram as três semanas. Numa bela manhã de Primavera apareceu o Rateco, não cabia em si de contente, a anunciar: “Nasceram os ratinhos, esta noite, e são lindos! A Mãe está feliz a dar-lhes de mamar.”
Fui logo vê-los. Pus-me de joelhos no chão e espreitei para debaixo do armário (tão pequeninos, ainda não podiam sair do ninho). Que beleza! Todos cor-de-rosas, de olhos ainda fechados mas já a enroscarem-se, a esticar as pernitas e a chiar: Hi!... Hi!... Hi!...
Eram três meninos e duas meninas! Os pais estavam encantados e a Avóinha também!
“Já temos nomes para eles” disse a Filó, “Joanico, Sarapico, Tico-Tico, Marieta e Carapeta!”
E a Avóinha, entusiasmada, fez logo uma canção para os embalar:

Nana, nana, Sarapico…
Dorme, dorme, Tico-Tico…
Joanico, meu amor,
Olha as manas, por favor:
Não acordes a Carapeta,
Deixa dormir a Marieta,
Ninguém pode chiar…
Quero tudo a descansar…

Nana, nana, Sarapico…
Dorme, dorme, Tico-Tico…

Nana, nana, Marieta…
Dorme, dorme, Carapeta…
Cada qual no seu lugar,
Quero todos a descansar…
Sarapico e Joanico
Não acordem o Tico-Tico,
Assim mesmo enovelada,
Que bela é esta ninhada!

Nana, nana, Marieta…
Dorme, dorme, Carapeta…


Serra da Amoreira, Março de 2010

Para os meus netos mais pequenos
Avóinha Sãozinha

domingo, 28 de março de 2010

Histórias para a Páscoa - A Pata Genoveva

CATRAPUZ!...
O que é isto... Que aconteceu?... Estava a dormir tão bem, na minha cama, tão sossegada, e… de repente… Que é isto?... Que foi?... Um bicho?... Tem penas e faz cuá-cuá… Esfrego os olhos, penso que foi um sonho mau, mas o bicho está a mexer-se… e eu cheia de medo encolho-me, escondo a cara na almofada… e agora o bicho puxa-me pelos cabelos, faz-me cócegas atrás das orelhas… quer mesmo chamar a minha atenção!…
Não, assim não pode ser. Eu sou corajosa! De um pulo sento-me na cama, cruzo as pernas, e… à minha frente está uma pata. Que linda pata! Toda branca, gordinha, a piscar-me o olho e a rir-se para mim.
Estou mesmo a ver que não acreditam no que eu digo… Mas olhem que é verdade e eu vou explicar:
Hoje é Domingo de Ramos, de hoje a oito dias Domingo de Páscoa. Eu andava aflita, ainda não tinha história para os netos, nem tempo para a escrever, nem ideias engraçadas, nem malucas, nem desajeitadas…
Então a minha imaginação descobriu a pata, e ela aqui está, de carne e osso, aterrou em cima da minha cama e prepara-se para nos contar a sua história.

História da Pata Genoveva

Eu sou uma pata lisboeta. O meu Pai e a minha Mãe viviam no Campo Grande mas quando resolveram ter uma família mudaram-se para o Jardim da Estrela. Era mais abrigado, não tinha tanta poluição e como tem gradeamento a toda a volta, eu e os meus irmãos ficaríamos mais protegidos. Assim, num ninho à beira do lago, onde a minha Mãe pôs oito ovos e onde durante quatro semanas os chocou com muito amor e carinho, nascemos nós, seis patas e dois patos. A mim puseram-me o nome de Genoveva, Genoveva Pata Estrela, nascida na freguesia da Lapa, concelho de Lisboa, no dia 18 de Junho de 2004, só não tenho nº de B.I. porque os patos não usam bilhete de identidade.

Cresci no Jardim da Estrela, muito feliz. Brincávamos, eu e os meus irmãos, nadávamos e mergulhávamos no lago e gostávamos de andar sempre em fila uns atrás dos outros. Parece que eu era a mais atrevida, dizem os meus Pais. Gostava de pregar partidas às pessoas que passeavam no jardim, sobretudo aos namorados que estavam sempre tão entretidos que nem davam pela falta dos lenços e carteiras delas, com que eu gostava de me enfeitar, ou dos óculos escuros e bonés deles com que eu fazia palhaçadas e divertia os meus irmãos. Uma dia apanhei um MP3, puz os auscultadores nos ouvidos e… foi uma festa! Dancei, dancei, dancei sem parar! Juntou-se uma roda de gente, aplaudiam, batiam palmas e diziam: A patita tem alma de artista!
A minha Mãe é que não gostou nada: “Oh Genoveva, foi esta a educação que te dei? Uma menina pata bem-educada deve ser recatada”.
Agarrou-me pelo rabito e lá me levou, aos trambolhões, para a casa dos patos, à beira do lago. Chorei, chorei, toda essa noite!... O meu desgosto não era tanto por a minha Mãe me ter ralhado, era sim, por ter descoberto que era uma pata artista e que se calhar a família não ia gostar nem ia apoiar a minha arte.
Nos primeiros tempos foi duro, chamavam-me maluca, riam-se, e os meus irmãos atrás de mim, cantavam assim:

Genoveva, Genoveva,
Ninguém te quer, ninguém te leva,
Tem graça uma pata actriz?
Só, com um dedo no nariz!
E nos estúdios da televisão?
Pata é boa p´ra lavar o chão!
Genoveva, Genoveva,
Ninguém te quer, ninguém te leva…

Mas eu nunca desisti. Treinei, às vezes escondida atrás das árvores, estudei, fiz ginástica, ballet, tirei cursos de arte. Logo que comecei a ter asas bastante fortes para poder voar, atrevi-me a sair do jardim e voei até ao Chapitô*. Aí ensinava-se arte a sério e ninguém se importava com a aparência dos outros, aceitaram-me mesmo sendo pata e fiz-me uma grande artista.
Ao voltar ao jardim o ambiente era outro. Os meus Pais envaideciam-se com a minha arte, os meus irmãos entusiasmavam-se e queriam sempre assistir aos meus espectáculos. Os jardineiros, tratadores de animais e guardas que trabalhavam no jardim orgulhavam-se de mim. Os passeantes, namorados, velhotes, avós com os seus netinhos, garotos vindos das escolas, todos passaram a ser meus incondicionais espectadores
Consegui fazer o que queria na vida. Hoje sou uma artista consagrada. Há cartazes por Lisboa a anunciarem as minhas actuações, já trabalhei no Teatro D. Maria II e até já contracenei com a Eunice Munhoz e com o Rui de Carvalho!

Deves estar agora a pensar porque é que eu vim parar aqui, acima da tua cama, e, agora, na altura da Páscoa. É que os artistas gostam sempre de colaborar nas boas causas. E é uma boa causa distribuir ovos de chocolates pelos meninos de todo o mundo no Domingo de Páscoa.
Queres-me dar os teus ovos para eu os ir esconder por esses jardins do mundo inteiro? Como tenho umas asas fortes consigo chegar a toda a parte… E. também posso fazer os meus números artísticos, e que poderão ser vistos por todos os meninos com os olhos da sua imaginação…


Páscoa, 2010

Maria da Assunção Ferraz de Oliveira

*Escola Profissional de Artes e Ofícios do Espectáculo